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Arachis: Origen, variabilidad genética y potencial agronómico

Caroline Marques Castro Caroline Marques Castro1, José Francisco Montenegro Valls2 & Cláudio Takao Karia3



1Pesquisador da Embrapa Clima Temperado,
BR 392, Km 078, C. P. 403, Pelotas - RS, Brasil. CEP. 96001-970.
( caroline@cpact.embrapa.br )

2Pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia,
Av. W3 Norte (final) s/n, Ed. Sede Embrapa, CEP. 02372, Brasília – DF, Brasil. CEP. 70770-900. ( valls@cenargen.embrapa.br )

3Pesquisador da Embrapa Cerrados,
BR 020, Km 018, C. P. 403, Planaltina - DF, Brasil. CEP. 73301-970.
( karia@cpac.embrapa.br )

El presente artículo, es el primero de una serie, que Caroline Marques Castro presentó al Instituto de Biociencias, Campus de Botucatu, de la Universidad Estadual de São Paulo UNESP, como parte de los requisitos necesarios para a obtención del título de Doctor en Ciencias Biológicas - Genética.

INTRODUÇÃO

Arachis Pintoi Os recursos genéticos do gênero Arachis incluem o amendoim comum, Arachis hypogaea L., amplamente cultivado para produção de grãos para consumo direto e extração de óleo comestível. A. villosulicarpa Hoehne, espécie cultivada para a produção de grãos por indígenas do Mato Grosso, e 78 outras espécies consideradas silvestres (VALLS & SIMPSON, 1994), destas, mais de 60 são nativas do Brasil.

Entre as várias espécies desse gênero, tem sido destacados o potencial de utilização em pastagens das duas únicas espécies da secção Caulorrhizae, Arachis repens Handro e Arachis pintoi Krapov. & W. C. Gregory, e de Arachis glabrata Bentham, da secção Rhizomatosae (VALLS, 1992).

Duas cultivares de A. glabrata foram liberadas comercialmente nos Estados Unidos, “Florigraze” e “Arbrook” (FRENCH et ali., 1994), e uma na Austrália, a cultivar “Prine”. Porém, devido à propagação dessa espécie ser exclusivamente por rizomas, o que dificulta a mecanização de seu cultivo e sua conseqüente expansão em grandes áreas, considera-se que a maior promessa para uso forrageiro encontra-se entre as espécies da secção Caulorrhizae, essas exclusivas da flora brasileira (VALLS & SIMPSON, 1994).

Além dos atributos forrageiros, as espécies da secção Caulorrhizae, estoloníferas, mostram-se muito promissoras para incorporação em sistemas agrícolas sustentáveis (PIZARRO, 2001b). Entretanto, embora as espécies de Arachis ocorram amplamente em cinco países da América do Sul, e tenham seu valor como plantas forrageiras reconhecidas na Austrália, Colômbia, Costa Rica, Honduras e nos Estados Unidos, essas espécies não foram propagadas tão deliberadamente para uso forrageiro na América do Sul como ocorreu com outras leguminosas estrangeiras ou exóticas (PIZARRO & CARVALHO, 1996).

As principais restrições apresentadas a espécies forrageiras de Arachis baseiam-se principalmente no seu alto custo de implantação e no seu lento estabelecimento (KERRIDGE, 1994). De fato, o acesso tipo de A. pintoi mostra estabelecimento lento. Porém, no germoplasma adicional da secção Caulorrhizae encontra-se grande variabilidade na taxa e velocidade de cobertura do solo. Além disso, experimentos têm mostrado que o uso de sementes, ao invés de propágulos vegetativos na implantação da pastagem resulta em um estabelecimento mais rápido (PIZARRO, 2001a).

O custo de produção de sementes é elevado, principalmente devido a frutificação geocarpia da espécie, com 90% da produção de frutos ocorrendo a uma profundidade de até 10 cm no solo (FERGUSON et al., 1992; CARVALHO, 1996), o que impõe a necessidade de busca por acessos com alta produção de sementes, e, ou, com sua formação mais superficial. A variabilidade encontrada no germoplasma da secção Caulorrhizae sugere que uma adequada seleção possa resultar em lançamentos comerciais de grande potencial (CARVALHO et al., 1997; PIZARRO, 2001a).

Adicionalmente, a possibilidade de ampliação da variabilidade genética através de cruzamentos inter e intra-específicos também tem sido demonstrada com bastante sucesso (VALLS et al., 2001; OLIVEIRA & VALLS, 2003).

Nos últimos 13 anos, foram lançados mais de 10 cultivares da secção Caulorrhizae em diversos países (PAGANELLA & VALLS, 2002), todas pela exploração direta de ecótipos que ocorrem na natureza. A realização de cruzamentos artificiais, originando novas combinações híbridas envolvendo acessos divergentes dessa secção, é de grande interesse para o melhoramento genético de amendoim forrageiro, não só pela potencialidade de explorar o vigor híbrido na geração F1, através de propagação por estolhos, como também por promover a formação de populações com grande variabilidade, resultante dos eventos de recombinação genética. A caracterização dessas populações são passos fundamentais na definição da exeqüibilidade da inserção desse germoplasma em programas de melhoramento.

Diante do interesse pelo potencial de uso forrageiro e de cobertura do solo das espécies da secção Caulorrhizae, o presente trabalho tem como objetivo caracterizar a variabilidade genética de acessos de elite, híbridos e populações segregantes de espécies da secção Caulorrhizae, identificando acessos, híbridos, e populações promissoras, assim como as correlações entre os componentes biológicos da produção de sementes e de forragem, e a possibilidade de adoção de alguns caracteres morfológicos como descritores varietais no desenvolvimento de novos cultivares, vindo a colaborar com o melhoramento genético e futura inserção dessas espécies para cultivo em sistemas agrícolas sustentáveis.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Gênero Arachis

O gênero Arachis é composto por espécies diplóides (2n=2x=20; ou, 2x=18) e tetraplóides (2n=4x=40) (FERNÁNDEZ, A. & KRAPOVICKAS, 1994; LAVIA, 1998). Pertence a família Leguminosae, subfamília Papilionoideae, tribo Aeschynomeneae e subtribo Stylosanthinae. Ocorre naturalmente na América do Sul, estendendo-se ao leste dos Andes, sul da Amazônia, norte da Planície Platina e noroeste da Argentina (KRAPOVICKAS & GREGORY, 1994).

Existem aproximadamente 80 espécies neste gênero, 64 destas ocorrem no Brasil, sendo 48 restritas ao território brasileiro. Quinze estão distribuídas na Bolívia, 14 no Paraguai, 6 na Argentina e 2 no Uruguai (VALLS & SIMPSON, 1994).

O gênero é composto por nove secções, Erectoides, Trierectoides, Extranervosae, Triseminatae, Heteranthae, Caulorrhizae, Procumbentes, Rhizomatosae e Arachis (KRAPOVICKAS & GREGORY, 1994).

Origem e dispersão do gênero Arachis

A serra do Amambaí, no limite do Mato Grosso do Sul e Paraguai, é considerada o local de origem do gênero Arachis, por ali viver A. guaranitica, possivelmente a espécie mais antiga do gênero (GREGORY, et al. 1980).

De acordo com a maior parte das informações publicadas na literatura, as espécies do gênero Arachis são autógamas, com fluxo gênico limitado a pequenas populações. Com base nas suas características morfológicas, as espécies de Arachis não podem dispersar suas sementes em um raio acima de um ou dois metros ao ano, a partir do local de germinação. Estando este gênero em uma área de aproximadamente 4000 km de extensão, outros mecanismos estão envolvidos na sua disseminação. A dispersão fluvial é bastante significativa, pois muitas espécies mostram-se associadas às bacias de grandes rios. A dispersão zoófila e a ação do homem, fixando as espécies nos novos locais de colonização, também não pode ser descartada (KRAPOVICKAS & GREGORY, 1994).

Secção Caulorrhizae

Nesta secção encontram-se duas espécies, A. pintoi e A. repens. É uma secção composta por plantas perenes, com raízes axonomorfas sem engrossamentos, ramos estendidos, procumbentes, ocos e radicantes nos nós, formando estolhos (KRAPOVICKAS & GREGORY, 1994).

A distribuição geográfica desta secção compreende as bacias dos rios Jequitinhonha, São Francisco e Paraná, região que cobre parte dos estados de Goiás, Bahia e Minas Gerais, chegando até o litoral atlântico, onde foi coletado o acesso original de A. pintoi, GKP 12787 (VALLS & PIZARRO, 1994). Há indícios de que a maior variabilidade genética de acessos desta secção concentra-se na bacia do rio São Francisco, tanto com base em descritores morfológicos (MONÇATO, 1995), como moleculares (GIMENES et al., 2000).

As características morfológicas tamanho e forma dos folíolos, e presença ou ausência de cerdas nos pecíolos e nas costas do folíolo são as que mais diferenciam as espécies da secção Caulorrhizae (KRAPOVICKAS & GREGORY, 1994).

A caracterização taxonômica das espécies desta secção foi praticamente toda baseada em apenas dois acessos amplamente difundidos, GKP 10538 de A. repens e GKP 12787 de A. pintoi (VALLS & SIMPSON, 1994). Com o enriquecimento do germoplasma disponível de A. pintoi, foi possível observar uma grande variação no formato e na dimensão dos folíolos, densidade e localização dos pêlos e cerdas. Da mesma forma, uma variação paralela foi observada nas novas coletas de A. repens, tornando a circunscrição individualizada das espécies da secção Caulorrhizae bastante difícil (VALLS, 1992).

O dendrograma resultante da avaliação morfológica de 51 acessos da secção Caulorrhizae mostra a separação dos acessos típicos de A. repens do demais, com um grupo a seguir composto por formas intermediárias mais semelhantes a A. repens e logo um grupo de acessos típicos de A. pintoi com as demais formas intermediárias, confirmando a separação de A. pintoi e A repens, mas ficando entre eles um conjunto de acessos com formas intermediárias, que mais se aproximam de A. pintoi (MONÇATO, 1995).

A caracterização das progênies de 11 acessos de Arachis pintoi e 13 acessos de A. repens com o uso de marcadores RAPD separou os acessos representantes de cada espécies. Entretanto, com base em marcadores isoenzimáticos e com proteínas de reserva não foi clara esta separação (BERTOZO, 1997). A análise de 64 acessos da secção Caulorrhizae com marcadores RAPD mostrou a maioria dos acessos de A. repens em um grupo distinto, embora tenha sido detectado um relacionamento muito próximo entre ambas espécies (GIMENES et al., 2000). A análise com base em marcadores AFLP de 74 acessos da secção Caulorrhizae permitiu distinção das duas espécies. Dois grandes grupos foram originados, o primeiro formado por acessos de A. repens e o segundo, subdividido em seis sub-grupos, apresentou apenas acessos de A. pintoi (BARATA et al., 2001).

Fortalecendo os achados morfológicos e moleculares, a esterilidade encontrada em híbridos interespecíficos, Arachis pintoi x A. repens, justifica a manutenção destes dois taxa como distintos (OLIVEIRA, 1997; CARVALHO, 2000).

Arachis pintoi

Arachis É uma leguminosa herbácea, perene, de crescimento rasteiro e estolonífero, com uma altura entre 20 a 40 cm, raiz axonomorfa, sem engrossamentos. O primeiro ramo é ereto. De sua base partem ramos rasteiros, radicantes nos nós, cilíndricos, angulosos e ocos. As folhas são alternas, compostas, com quatro folíolos obovados (50 mm comprimento x 32 mm de largura), de cor verde-clara a escura. Estípula com a porção basal soldada ao pecíolo, medindo 10 – 15 mm comp. x três mm de largo e a porção livre medindo 10 – 12 mm comp. x 2,5 mm de largo na base.

Apresenta floração indeterminada e contínua. As espigas são axilares, quatro a cinco flores, esparsas, cobertas pela porção soldada da estípula. As flores são sésseis, protegidas por duas brácteas. O hipâncio é bem desenvolvido, podendo alcançar 10 cm de comprimento, com pêlos sedosos. A corola é amarela no exemplar típico. Estandarte 11 mm comprimento x 13 mm de largura, com nervuras amarelas, alas com oito mm comprimento x seis mm de largura, quilha 6 – 7 mm de comprimento, quatro anteras oblongas, basifixas e quatro anteras esféricas, dorsifixas e dois estaminódios, sendo considerada como uma espécie preferencialmente autógama (KRAPOVICKAS & GREGORY, 1994).

Arachis repens

É uma planta perene, de crescimento rasteiro e estolonífero. Possui uma altura entre 20 a 40 cm raiz ramificada, sem engrossamentos. Os ramos são muito estendidos, com raízes adventícias nos nós. Em plantas de um ano, o eixo central é delgado e flexível, curvado acima do solo e não possuem ramificações nos nós superiores. As folhas são quadrifoliadas, a estípula é formada por uma parte adnata, concrescida parcialmente ao pecíolo na base da folha, e umas partes livres, sendo a relação entre as duas partes de 1:1. Pecíolo e raque canaliculados, medindo 7-40 mm e 3-7 mm, respectivamente. Folíolos de forma elíptica a obovada, medindo 20-35 mm de comprimento por 8-12 mm de largura, com ápice mucronado e o par distal sempre maior que o basal.

Os folíolos apresentam a face superior glabra e a face inferior com pelos muito curtos. As inflorescências são axilares, pauciflora, coberta pela base das estípulas. O hipâncio com 3,5 -11 cm de comprimento, pêlos médios, cálice bilabiado, 7 mm de comprimento, coberto de pelos apressos e com grandes cerdas. O estandarte é totalmente amarelo na forma típica, com 8-13 mm de comprimento por 16- 17 mm de largura, com asas e quilhas amarelas (KRAPOVICKAS E GREGORY, 1994). É uma espécie que apresenta como característica a raríssima produção de sementes, tanto na natureza como em parcelas experimentais (VALLS, 1992).

Variabilidade genética na secção Caulorrhizae

Ao longo dos últimos anos o germoplasma de espécies da secção Caulorrhizae do gênero Arachis vem sendo bastante estudado.

Variabilidade intraespecífica foi encontrada em oito acessos de Arachis pintoi caracterizados bioquimicamente, pelas isoenzimas ?-EST, ACP, GOT e DIA, e morfologicamente, com base em 60 descritores. Os caracteres nervura na parte adnata e cerdas na estípula, comprimento e forma do folíolo apical, cerdas no folíolo, comprimento e pilosidade do hipanto, comprimento do legume ou segmento basal e bico do legume foram recomendados para a caracterização do germoplasma de Arachis pintoi (MAASS et al., 1993).

Proteínas totais, isoenzimas e RAPD foram utilizadas na caracterização de 24 acessos, 11 de A. pintoi e 13 A. repens. A variação protéica foi maior entre os acessos do que dentro (BERTOZO & VALLS, 2001). A variação aloenzimática total mostrou que 60 % da diversidade alélica encontra-se entre os 11 acessos A. pintoi estudados. Com base em 165 bandas RAPD, a AMOVA detectou 53.59 % da variação total entre os 24 acessos estudados (BERTOZO, 1997).

Isoenzimas foram utilizadas para caracterizar o acesso original de A. pintoi (GKP 12787) e seus derivados, distribuídos para diferentes países. Alta uniformidade foi encontrada entre as coleções avaliadas, indicando a manutenção de uma estreita base genética para os locos estudados (VALENTE et al., 2001).

A caracterização morfológica de sete cultivares e 13 acessos de Arachis pintoi e dois de A. repens também evidenciou alta similaridade entre o acesso original, GKP 12787 e suas cultivares derivadas, ‘Amarillo’, ‘Maní Forrajero Perenne’, ‘Maní Mejorador’ e ‘Amarillo MG-100’, além de mostrar uma predominância de indivíduos descendentes do acesso original GKP 12787 na cultivar ‘Alqueire-1’ e mencionar a nítida diferença entre a cultivar ‘Belmonte’ e o acesso original (PAGANELLA, 2001; PAGANELLA & VALLS, 2002).

Biologia floral

A maioria dos trabalhos de biologia floral do gênero Arachis referem-se ao amendoim cultivado, A. hypogaea. As flores nascem de gemas reprodutivas na axila das folhas, em inflorescências contendo de um a nove potenciais nós reprodutivos (SIMPSON et al., 1994). A produção de flores é fortemente dependente do fotoperíodo, com 12 horas de comprimento de dia como valor mínimo crítico (KETRING, 1979), embora nem todas as espécies sejam tão fortemente sensíveis ao fotoperíodo (SIMPSON et al., 1994). A curva de florescimento de 14 acessos de A. pintoi e A. repens em Planaltina, DF, mostrou que a intensidade máxima de florescimento ocorre entre novembro e dezembro e está, para alguns acessos, associada à precipitação pluviométrica e temperatura do ar (PEÑALOZA, 1995).

Os botões florais em desenvolvimento tornam-se visíveis 36 a 48 horas antes da abertura da flor. Estes apoiam-se no ápice de um cálice tubular, denominado de hipâncio, o qual inicia um desenvolvimento acelerado cerca de 24 horas antes da antese. A flor possui corola papilionada, com uma pétala grande, o estandarte, duas pétalas menores, denominadas de asas, e duas pétalas soldadas, formando a quilha, que envolve a porção apical do estilete, o estigma e os estames. Todas estas peças estão envoltas por cinco brácteas do cálice. As flores normais possuem estigma tipo plumoso ou tipo bastão, com 10 estames, desses, quatro possuem anteras biloculadas, quatro globosas e há dois estaminódios. O estigma encontra-se assentado no ápice de um longo estilete que percorre internamente todo o comprimento do hipâncio até o ovário, que situa-se na axila das brácteas da inflorescência, e contém dois a três óvulos (SIMPSON et al., 1994).

Os estigmas são classificados em dois grandes grupos, os estigmas secos, que apresentam uma película extranuclear hidratada e protéica, mas sem secreção livre, e os estigmas úmidos, que liberam uma secreção quando receptivos. O estigma de A. hypogaea foi descrito como tipo seco papilado, com esterase não específica e atividade fosfatase localizada na fina película que cobre as papilas (HESLOP-HARRISON e SHIVANA ; 1977).

A morfologia do ápice do estigma de espécies anuais e perenes de Arachis foi estudada por BANKS (1990) e por LU et al. (1990), tendo sido encontrados pêlos unicelulares no ápice dos estigmas de algumas espécies. Estes se desenvolvem a partir das células da epiderme, subjacentes ao estilete. As espécies perenes, pouco prolíferas, apresentam estes pêlos, enquanto que a ausência de tais pêlos está associada às espécies anuais. A presença de muitos pêlos no ápice do estigma pode dificultar, ou até mesmo impedir o contato de grãos de pólen viáveis com as papilas da superfície estigmática, resultando em uma barreira física à polinização.

A variação encontrada na superfície estigmática entre espécies perenes e anuais por LU et al. (1990), foi encontrada também por PEÑALOZA (1995), ao analisar espécies da secção Caulorrhizae, exclusivamente perenes, porém com históricos diferentes de prolificidade. A maturação do pólen ocorre aproximadamente 6 a 8 horas antes da antese, mas a polinização usualmente não se dá antes da abertura da flor (antese). Amostras de grãos de pólen de A. glabrata incubadas em câmaras com temperatura variando de 20 a 35oC atingiram picos de germinação similares, sendo este pico alcançado mais cedo, se o pólen for exposto a temperaturas mais elevadas (NILES e QUESENBERRY, 1992).

A fertilização ocorre 12 horas após a polinização. Após a fertilização o embrião sofre quatro a cinco divisões, e torna-se dormente. Ao mesmo tempo, um meristema intercalar é ativado na base do ovário e inicia o desenvolvimento de um “peg”, o qual é geotrópico positivo. O comprimento do “peg” esta sob efeito genético e ambiental. Este continua a crescer, e ao penetrar no solo, pode sofrer engrossamento em algumas espécies, ou se tornar bastante fino em outras. Na maioria das espécies silvestres encontra-se dois segmentos de frutos e um istmo entre eles (SIMPSON et al., 1994).

Modo de reprodução

As espécies do gênero Arachis são consideradas preferencialmente autógamas (KRAPOVICKAS & GREGORY, 1994). Espécies autógamas preservam aproximadamente 56 % de seus alelos dentro de uma única população (HAMRICK, 1983). Os resultados de análises de isoenzimas e RAPD mostram a autogamia como sendo o sistema de reprodução predominante em acessos de A. pintoi (BERTOZO, 1997), mas, também há evidencias de alogamia em alguns acessos da secção Caulorrhizae (OLIVEIRA & VALLS, 2003).

Híbridos naturais ocorrem com baixa freqüência neste gênero. Entretanto, dois híbridos identificados em parcelas experimentais foram introduzidos na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília-DF. Um deles, é interespecífico e denominado de “Ag 1”, provavelmente oriundo de um cruzamento natural entre A. pintoi (GKP 12787) com A. kretschmeri (KrRy s/n), da secção Procumbentes (TEIXEIRA, 1999). Outro é intraespecífico e denominado de “W 34b”, foi encontrado em um canteiro experimental de A. pintoi localizado na Embrapa Cerrados, em Planaltina-DF (CARVALHO, 2000).

Embora a forma usual de reprodução no gênero seja sexual, algumas espécies apresentam intensa propagação vegetativa, como exemplo A. repens, com raríssima produção de sementes. A capacidade de enraizamento nos nós, característica da secção Caulorrhizae, torna fácil a propagação vegetativa das espécies desta secção (SIMPSON et al., 1994).

Alguns estudos citológicos evidenciam um potencial para apomixia em A. hypogaea, caso este evento ocorra em espécies com potencial forrageiro, a produção de linhas heterozigóticas estáveis seria favorecida (SIMPSON et al., 1994).

Cruzabilidade

As várias espécies de Arachis mostram um diferente potencial de recombinação. As duas espécies de maior interesse forrageiro A. glabrata e A. pintoi, apresentam uma limitada oportunidade de recombinação (SIMPSON et al. 1994). As espécies da secção Rhizomatosae não são boas produtoras de sementes. Mesmo com viabilidade de pólen alta, sua falha na obtenção de híbridos pode ser devido a outras causas além da incompatibilidade genética, como a pequena superfície estigmática e a presença de pêlos unicelulares no ápice do estigma (Lu et al., 1990).

Variabilidade quanto à produção de sementes é encontrada entre acessos de A. pintoi (CARVALHO, 1996). Os vários acessos de A. pintoi, aparentemente autógomos típicos, exibindo pouca ou nenhuma heterozigose, apresentam potencial para polinização cruzada e recombinação genética para o melhoramento de plantas (SIMPSON et al., 1994).

A hibridação interespecífica dentro da secção Caulorrhizae tem sido bem melhor sucedida que na secção Rhizomatosae. O primeiro híbrido interespecífico resultante do cruzamento entre Arachis pintoi e A. repens apresentou 86,8 % de viabilidade de grão de pólen, fertilidade bem maior do que a freqüentemente encontrada em cruzamentos intraespecíficos de outras secções (GREGORY & GREGORY, 1979).

Vinte híbridos, de 1420 polinizações realizadas, foram obtidos a partir de cruzamentos envolvendo cinco acessos de Arachis pintoi e dois acessos de A. repens. (OLIVEIRA & VALLS, 2003). De 3797 polinizações, 269 sementes híbridas foram obtidas em cruzamentos intra e interespecífcos entre acessos da secção Caulorrhizae (CARVALHO, 2000). Alta viabilidade de pólen foi encontrada em todos os híbridos, mas os híbridos interespecíficos não produziram sementes.

Em cruzamentos entre espécies da secção Caulorrhizae com espécies das secções Procumbentes e Erectoides, os híbridos herdaram estolhos, com capacidade de enraizamento tão boa ou superior à dos pais (TEIXEIRA, 1999).

Os híbridos resultantes de combinações envolvendo diferentes acessos da secção Caulorrhizae e acessos de outras secções do gênero Arachis mostram que alguns híbridos intraespecíficos de A. pintoi produzem linhas segregantes para programas de melhoramento genético, enquanto que híbridos interespecíficos e interseccionais podem ser propagados vegetativamente, disponibilizando o potencial genético de duas secções (VALLS et al., 2001).

Potencial agronômico

As leguminosas forrageiras de clima quente são tipicamente dos trópicos americanos, onde a população de herbívoros sempre foi menor do que nas savanas africanas. O repetido insucesso no uso de leguminosas nos trópicos criou uma barreira na sua adoção pelos pecuaristas.

As espécies de Arachis revitalizaram o interesse em leguminosas tropicais devido ao seu valor como forrageira e densa cobertura do solo, sendo chamadas de “alfafa das savanas” em função de seu valor nutritivo e palatabilidade (VALLE, 2001).

Praticamente todas as espécies de Arachis produzem forragem de boa qualidade e em razoável quantidade, quando comparadas com espécies de outros gêneros de leguminosas utilizadas comercialmente (VALLS & SIMPSON, 1994). Espécies pertencentes às secções Rhizomatosae, Arachis, Erectoides, Procumbentes, Caulorrizae e Triseminatae têm sido avaliadas na Austrália há 50 anos, tendo muitas destas espécies apresentado grande potencial forrageiro, principalmente no que se refere à persistência sob pastejo (COOK et al., 1994).

Dentre as várias espécies do gênero que apresentam potencial para utilização em pastagens visando à melhoria da qualidade da forragem ofertada, destacam-se as espécies da secção Caulorrhizae, A. pintoi e A. repens e A. glabrata da secção Rhizomatosae (VALLS, 1992). Duas cultivares de A. glabrata foram liberadas comercialmente nos Estados Unidos, “Florigraze” e “Arbrook” (FRENCH et ali., 1994), e uma na Austrália, cv. “Prine”.

Devido à propagação exclusivamente vegetativa, por rizomas, de Arachis glabrata, o que dificulta a mecanização de seu cultivo e sua conseqüente expansão em grandes áreas, e à suscetibilidade de acessos desta espécie a determinados patógenos, quando avaliados em área de várzea em Planaltina, DF (PIZARRO et al., 1993), consideram-se que a maior promessa para uso forrageiro encontra-se entre as espécies da secção Caulorrhizae, estas exclusivas da flora brasileira (VALLS & SIMPSON, 1994).

A. pintoi é uma leguminosa forrageira de alta qualidade (LADEIRA et al., 2002), com valores médios de proteína bruta variando de 12.2% a 21.8% nas folhas durante o período seco e chuvoso, respectivamente, e 9.3% e 13.5% nos ramos durante os mesmos períodos (ARGEL & PIZARRO, 1992). A digestibilidade média encontrada na época da seca foi de 67%, e na época chuvosa de 62% (RINCÓN et al., 1992), além de apresentar grande aceitabilidade pelos animais (LASCANO & THOMAS, 1988; CARULLA et al., 1991).

Apresenta excelentes características agronômicas, como adaptação a solos ácidos, resistência e tolerância a pestes e doenças, e prolífera produção de sementes em alguns acessos (ARGEL & PIZARRO, 1992; ARGEL & VILARREAL, 1998).

Persiste ao pastoreio, devido ao hábito de crescimento reptante, habilidade de enraizar nos estolhos e reserva de sementes no solo (JONES, 1993). Mostrou-se bastante persistente em consorciação com Brachiaria dictyoneura mesmo quando submetido a taxas de lotação de até quatro novilhos/ha (SANTANA et al., 1998). À semelhança de Trifolium repens (PEREZ et al.; 2001), Arachis pintoi possui seus pontos de crescimento protegidos, permitindo que uma área foliar residual satisfatória seja mantida, mesmo quando submetido a um pastejo contínuo (GROF, 1985).

A. pintoi cresce bem em uma amplitude de solos com texturas que vão desde solos pesados argilosos, a arenosos, mas mostra-se com crescimento melhor quando em solos areno-argilosos, desde que não haja limitação de umidade (PIZARRO, 2001a). O amplo espectro de adaptação é confirmado pelo acesso GKP 12787 que, no Sul do Brasil, após a exposição a baixas temperaturas, mostrou um bom vigor de rebrote (DAMÉ et al., 1999), e em sete locais da África Central e Oeste, apresentou produções de forragem variando de 0.6 a 3.2 t/ha no período de chuvas e de 0.1 a 2.0 t/ha na seca (STÜR & NDIKUMANA, 1994). Este mesmo acesso em Veracruz, no México, em três diferentes épocas dos anos alcançou produções de 2.0 t/ha, 1.2 t/ha e 0.8 t/ha (VALLES et al., 1992), e em Porto Rico foram estimadas produções de 2.1 t/ha de matéria seca, 16 semanas após o plantio (ARGEL, 1994).

No Brasil, na avaliação de leguminosas forrageiras em Manaus, AM, foram observadas produções anuais de matéria seca para os acessos de A. pintoi BRA-012122, 013251, 014931 e 016683 de 1 t/ha, 1.3 t/ha, 0.1 t/ha e de 1 t/ha respectivamente (PERIN et al., 1996). Em Rio Branco, AC, os acessos de A. pintoi BRA-013251 e 015121 mostram excelente adaptação, com produções de matéria seca de 4.9 t/ha e 4.4 t/ha respectivamente, no período chuvoso, com 16 semanas de crescimento, no segundo ano as produções foram de 6.4 t/ha e de 5.8 t/ha (VALENTIM, 1994), e os acessos BRA-031143, 014391 e 015253 exibiram produtividade de foragem acima de 15000 kg/ha/ano e 100% de cobertura do solo após o estabelecimento (VALENTIM, 1997). Em Sete Lagoas, MG, os acessos de A. pintoi BRA-013251, 015253 e 015598 apresentaram aos sete meses após o plantio produções de matéria seca de 1.2 t/ha, 1.9 t/ha e 1.8 t/ha respectivamente (PURCINO & VIANA, 1994).

No acompanhamento do desenvolvimento de uma população nativa de A. pintoi em Formosa, GO, acesso BRA015121, foram observados valores de 9.5 t/ha de matéria seca no período de chuva, 1.4 t/ha na seca e rebrote de 1.0 t/ha aos 88 dias de início da estação chuvosa (PIZARRO & CARVALHO, 1996).

Grande variabilidade foi encontrada na avaliação da produção de matéria seca de 32 acessos da secção Caulorrhizae consorciados com Paspalum atratum Swallen em solo LVE em Planaltina, DF, no período de máxima precipitação, com produções variando de zero a 2141 kg/ha, aos 45 dias e de 527 kg/ha aos 180 dias de crescimento no primeiro ano de estabelecimento, e de zero a 2002 kg/ha aos 180 dias de crescimento no segundo ano (CARVALHO et al., 1997).

As espécies da secção Caulorrhizae, em seus acessos típicos, são bastante divergentes quanto à produção de sementes. O acesso original de A. pintoi é bastante prolífero. Por outro lado, acessos de A. repens raramente produzem sementes, apesar de florescerem normalmente (VALLS, 1992). Em função da frutificação geocarpia, com 90% da produção de frutos ocorrendo a uma profundidade de até 10 cm no solo, a colheita de sementes envolve o revolvimento e o peneiramento desta camada de solo, o que torna o custo de produção bastante elevado, uma vez que se realizada manualmente, necessita aproximadamente de 600dias-homem/ha (FERGUSON et al., 1992).

A produção de sementes sofre interação genótipo ambiente (FERGUSON, 1994). O uso de irrigação, e a não realização de cortes, que embora quando realizados tenham induzido a fortes picos de florescimento, proporcionaram expressivos aumentos na produção de sementes do acesso BRA-031143 (ANDRADE & KARIA, 1997). Dados preliminares sugerem que ao desfolhar drasticamente a pastagem no período de três a seis meses após o plantio, a produção de sementes é bastante reduzida se comparada com cortes feitos após o pico de florescimento, 180 vs 700 kg/ha respectivamente (PIZARRO, 2001a).

Nos mais de 150 acessos do germoplasma da secção Caulorrhizae atualmente disponíveis (VALLS, 2001), há diferenças na produção de sementes, que oscilam de zero a sete t/ha (PIZARRO, 2001b).

Em Planaltina, DF, em solo glei pouco húmico, em 26 acessos de A. pintoi avaliados, a produção variou de 3708 kg/ha à 90 kg/ha, e de 364 kg/ha até a ausência de produção de sementes entre os seis acessos de A. repens, e em latossolo vermelho escuro, entre os acessos de A. pintoi a produção variou de 1242 kg/ha à 8 kg/ha, e entre os acessos de A. repens de zero a 112 kg/ha (CARVALHO, 1996). No Sul do Brasil a avaliação de sete acessos de A. pintoi mostrou diferenças significativas entre os acessos quanto a produção de flores e de sementes, sendo encontrada a maior produção no acesso BRA-013251, com 1100 sementes viáveis/m2 (DAMÉ et al., 1998).

As características encontradas nas espécies da secção Caulorrhizae de adaptabilidade a diversos ambientes, persistência, fácil estabelecimento vegetativo, tolerância ao sombreamento e disponibilidade de acessos que produzam sementes ou não, mostram o potencial de uso destas espécies como cobertura vegetal. Existem aproximadamente 6500 ha de A. pintoi plantados principalmente nos Estados Unidos, Austrália, Colômbia e Costa Rica com a finalidade de cobertura do solo. Estima-se aproximadamente a existência de 4000 ha no Brasil com possibilidade de uso de A. pintoi como cobertura de solo em plantações de café e na citricultura (PIZARRO, 2001b).

Como cobertura do solo em café, um estudo na Nicarágua mostrou A. pintoi como boa controladora de espécies indesejáveis e proteção do solo contra erosão (STAVER, 1996). Em cultivo com banana A. pintoi não afetou a produção, o crescimento e o desenvolvimento das bananeiras (PÉREZ, 1996). Em pomares de laranja, o acesso de A. pintoi CIAT 17434 (BRA- 013251) se comportou como uma espécie adequada para cobertura do solo, obtendo uma maior produção de frutos, uma cobertura mais rápida do solo e uma menor competição com o cultivo (PÉREZ-JIMÉNEZ et al., 1996).

No Brasil, no Acre, o acesso de A. pintoi BRA-031143 submetido a níveis de sombreamento de 0, 30, 50 e 70%, apresentou boa adaptação, produtividade e persistência, indicando a possibilidade de utilização desta leguminosa como cobertura do solo em sistemas agroflorestais e silvipastoris (ANDRADE & VALENTIM, 1997).

A plasticidade no uso de Arachis como forragem, feno, silagem, uso paisagístico e como cultivo de cobertura, junto com a sua capacidade de produzir sementes debaixo do solo, fazem desta forrageira uma leguminosa ideal para os trópicos latino-americano e mundial, tanto do ponto de vista nutricional, como social (PIZARRO, 2001b).